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A empresa pode monitorar o e-mail corporativo?

A empresa pode monitorar o e-mail corporativo?

A Constituição Federal de 1988 protege os direitos fundamentais à intimidade e à privacidade das pessoas e, por consequência, a sua condição de dignidade no que tange à tutela aos direitos de personalidade do empregado, conforme consta no art. 5º, inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” […]

A legislação penal – Lei nº 12.737/12 (apelidada de Lei Carolina Dieckmann) classifica como crimes a invasão, a obtenção e a transmissão de comunicações eletrônicas privadas, sejam estas arquivos, conversas ou informações.

A Lei nº 12.965/14 (apelidada de Marco Civil da Internet), em seu artigo 8º, dispõe sobre a nulidade das cláusulas contratuais que possam violar as comunicações privadas dos usuários da internet. Já o 10º prevê que o conteúdo digital privado somente poderá ser acessado e disponibilizado mediante ordem judicial.

Como se pode perceber, o conteúdo jurídico de proteção à privacidade do usuário é amplo, porém deve-se ressalvar quando os meios de comunicação digital (leia-se e-mail, Facebook, Messenger, Instagram e mais uma infinidade de programas existentes no mercado) são de propriedade/responsabilidade do empregador.

Um dos pontos principais de discussões jurídicas é o e-mail corporativo: serviço de correio eletrônico disponibilizado pela empresa ao empregado, com a finalidade única e exclusiva de que este mantenha contato com os clientes, demais membros da empresa e terceiros através do canal apropriado.

Tecnicamente não há diferenças entre o e-mail corporativo e pessoal. Na sua utilização existem diferenças substanciais: o e-mail particular trata de conteúdo privado que goza de proteção legal e não deve ser sujeito à violação, pois diz respeito somente à pessoa que detém o referido endereço eletrônico.

O e-mail corporativo é o serviço de correio eletrônico disponibilizado pela empresa ao empregado, com a finalidade única e exclusiva de que este mantenha contato com os clientes e demais membros da empresa através do canal apropriado, refletindo em uma complexidade de relacionamento e responsabilidade que a empresa possui perante seus clientes e terceiros pelas atitudes de seus empregados, a exemplo de comunicações realizadas em seu nome, a imagem transmitida, o conceito da empresa, o conteúdo disseminado, etc.

Por essa característica (acessado por ferramentas disponibilizadas pela empresa), a empresa ou o empregador pode, sim, fiscalizar o que é feito por seus funcionários em seu e-mail corporativo. Contudo, a questão não é totalmente pacífica e tem sido enfrentada pelos tribunais com cautela e bom senso.

O Código Civil e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) consideram que a empresa é a responsável pelos atos de seus funcionários. Isso se aplica também para o uso de e-mail corporativo que, de acordo com o Tribunal Superior do Trabalho (TST), pode ser monitorado pelas empresas sem ser considerada invasão de privacidade ou violação de correspondência.

O TST considera que e-mail corporativo é uma ferramenta de trabalho, de propriedade da empresa, fornecida ao empregado para auxiliar na execução de suas tarefas. A utilização do e-mail corporativo deve respeitar os objetivos previamente estabelecidos pela empresa, ou seja, as políticas de uso da referida ferramenta, para evitar que a empresa responda por danos decorrentes da sua utilização.

Não se trata de simplesmente monitorar! É preciso informar ao funcionário que o e-mail não pode ser usado para fins pessoais. As normas para o uso de e-mail devem ser bem estabelecidas e de conhecimento de todos os empregados. É importante avisar com antecedência que não há privacidade no e-mail corporativo e que ele é de uso exclusivo para assuntos de trabalho.

Isso não significa que deva ocorrer proibição para uso do e-mail corporativo para fins pessoais, pois a empresa pode admitir esse procedimento, dentro de preceitos legais e morais admitidos (coibindo uso indevido, negligente ou malicioso), porém isso não elimina da empresa o direito de analisar o seu conteúdo, pois dependendo dele pode haver consequências e responsabilidades para a empresa.

Importante destacar que não deve ser o mesmo tratamento aplicado aos conteúdos de mensagens instantâneas (Messenger, Whatsapp, Snapchat ou similar), pois, por serem pessoais e invioláveis, ainda que a comunicação ocorra durante o horário de trabalho e por meio de computador da empresa, não está sujeito a controle do conteúdo sem autorização prévia do empregado. Neste caso, além da proteção constitucional que não pode ser violada, tal prática pode configurar abuso de direito, passível de indenização pelo empregador.

Independente de todo o exposto, recomenda-se que o poder diretivo e de fiscalização do empregador seja exercido de forma cautelosa para que não atinja a intimidade e a privacidade do empregado. A empresa deve procurar sempre agir com bom senso, preventivamente instruindo e orientando seus empregados sobre as normas de utilização do sistema e da possibilidade de rastreamento e de monitoramento de seu correio eletrônico, sempre com autorização expressa para tal finalidade.

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Rudimar Roberto Bortolotto

Advogado, administrador, professor universitário, especialista em Direito Processual Civil e Mestre em Direito, sócio do Bortolotto & Advogados Associados.

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