Foi publicada no Diário Oficial da União de 14 de novembro de 2017 – edição extra –, a Medida Provisória 808/2017, que visa ajustar alguns aspectos da Reforma Trabalhista (Lei nº. 13.467).
A MP já está valendo, porém, para virar lei, de fato, terá que percorrer um caminho de apreciação no Congresso Nacional. O prazo constitucional para avaliação no Legislativo é de 60 dias, prorrogável por mais 60 dias, com suspensão durante o período de recesso.
Destacamos abaixo as principais mudanças trazidas pela MP:
Aplicação integral da Reforma Trabalhista em todos os contratos
O art. 2º da medida provisória 808 determina que a reforma se aplica integralmente aos contratos de trabalho vigentes, ou seja, as novas regras valem para contratos novos e também aqueles já firmados entre empregadores e empregados.
Essa é uma das nuances mais importantes porque, como regra, as normas de direito material se aplicam de imediato apenas aos novos contratos de trabalho, respeitado o ato jurídico perfeito (aquele que já acabou e foi realizado seguindo-se as normas antigas) e o direito adquirido.
Entretanto, se a norma for de ordem pública, poderá ser criada uma exceção a essa interpretação, já que há interesses sociais mais relevantes.
Assim, o legislador pode determinar o momento de aplicação da lei nova.
Dano extrapatrimonial
Texto em vigor: estabelecia no trecho sobre reparação de danos que a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, a autoestima, a sexualidade, a saúde, o lazer e a integridade física são bens juridicamente tutelados inerentes à pessoa física.
O que muda com a MP: são adicionados a esse tipo de bem: etnia, idade, nacionalidade, gênero e orientação sexual; a palavra sexualidade foi retirada e a expressão “pessoa física” foi substituída por “pessoa natural”.
Cálculo: a reforma vinculava a indenização ao salário recebido pelo trabalhador. A MP muda isso e vincula a indenização ao teto do INSS, entre três e 50 vezes esse limite, a depender da gravidade do dano. A exceção dessa regra é o cálculo da indenização por dano de acidente fatal, que terá o valor estipulado pelo juiz.
Reincidência: o texto em vigor previa que, em caso de reincidência, o juízo poderia elevar o valor da indenização ao dobro. O novo texto adiciona a previsão de que a reincidência só estará caracterizada se ocorrer num prazo de até dois anos após o fim da tramitação na Justiça da primeira ação.
A MP também retira a necessidade de identidade de partes para a elevação do valor da indenização, ou seja, se o empregador reincidir na mesma ofensa com outro empregado, poderá ser condenado no pagamento dobrado da indenização.
Trabalho intermitente
A MP traz muitas alterações nas regras para o trabalho intermitente. Ela retira, por exemplo, a multa para o empregado que aceita a convocação, mas não comparece ao trabalho.
Regulamenta formas de contratação, pagamento de férias e benefícios, extinção de contrato, verbas rescisórias.
Também estabelece que, se em um ano o trabalhador não for convocado, contado a partir da data da celebração do contrato, da última convocação ou do último dia de prestação de serviços, o que for mais recente, o contrato de trabalho intermitente está rescindido.
Outra mudança importante é que até 31 de dezembro de 2020, o empregado registrado por meio de contrato de trabalho por prazo indeterminado demitido não poderá prestar serviços para o mesmo empregador por meio de contrato de trabalho intermitente pelo prazo de 18 meses, contado da data da demissão do empregado.
Local e prazo para responder a convocação: a MP altera o prazo para o empregado responder a um chamado de trabalho intermitente após o recebimento da convocação. Antes, o prazo era de um dia útil. Com a MP, passa para 24 horas. Em caso de silêncio do convocado nesse prazo será presumida a recusa.
Auxílio-doença e salário-maternidade: será devido ao segurado da Previdência Social o auxílio-doença a partir da data do início da incapacidade. O salário-maternidade será pago diretamente pela Previdência Social.
Inatividade: será considerado período de inatividade o intervalo temporal diferente daquele para o qual o empregado intermitente foi convocado e tenha prestado os serviços. Durante o período de inatividade, o empregado poderá prestar serviço de qualquer natureza a outras empresas, que exerçam ou não a mesma atividade econômica, utilizando contrato de trabalho intermitente ou outra modalidade de contrato de trabalho.
O período de inatividade não será considerado tempo à disposição do empregador e não será remunerado.
Alerta: restará descaracterizado o contrato de trabalho intermitente caso haja remuneração por tempo à disposição no período de inatividade.
Trabalhador autônomo
A reforma criou o artigo 442-B da CLT que definia que a contratação do autônomo, cumpridas todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afastaria o vínculo empregatício previsto no art. 3º da CLT.
A MP 808 acrescentou 7 parágrafos ao art. 442-B da CLT e a grande mudança é que proíbe a inclusão de cláusula de exclusividade no contrato de prestação de serviços.
Segundo a redação da MP, o autônomo poderá prestar serviços de qualquer natureza a outros tomadores de serviços que exerçam ou não a mesma atividade econômica, sob qualquer modalidade de contrato de trabalho, inclusive como autônomo.
Também garante ao autônomo a chance de se recusar a fazer a atividade pedida pelo contratante, garantida a aplicação de cláusula de penalidade prevista em contrato.
A MP também indica que motoristas, representantes comerciais, corretores de imóveis, parceiros, e trabalhadores de outras categorias profissionais reguladas por leis específicas relacionadas a atividades compatíveis com o contrato autônomo, desde que cumpridos os requisitos do artigo 442-B, não possuirão a qualidade de empregado prevista o art. 3º da CLT.
Porém, é preciso ter em mente que esses trabalhadores poderão vir a comprovar em juízo a presença da subordinação jurídica, a qual, caso acolhida, ensejará a declaração do vínculo de emprego.
Gorjeta
Antes da reforma: não havia uma regra geral sobre o tema na CLT até a chegada da Lei da Gorjeta (Lei 13.419/2017), em vigor desde maio deste ano. Esse texto definiu como teria de ser o rateio da cobrança em bares, restaurantes, hotéis, motéis e estabelecimentos similares. Estabeleceu a garantia, por exemplo, de que se tratava de uma receita dos trabalhadores, mesmo quando cobrada pelo empregador. E a empresa que não fizesse o repasse teria de pagar multa ao empregado que, no caso de reincidência, teria seu valor triplicado.
Reforma trabalhista: acabou retirando parágrafos da Lei da Gorjeta introduzidos na CLT, como aquele que garantia esse dinheiro para os empregados, com distribuição e rateios definidos por convenção ou acordo coletivo. Legalmente, a gorjeta voltou à situação anterior a maio deste ano, sem um regramento nacional.
Com a MP publicada agora: foram recolocadas as regras sobre a gorjeta que estavam na Lei 13.419. Entre elas, a que determina que empresas anotem na carteira de trabalho o salário fixo e a média das gorjetas dos últimos 12 meses.
Também está de volta a garantia da gorjeta como dinheiro dos empregados e a multa para o empregador que descumprir isso: equivalente a 1/30 avos da média da gorjeta por dia de atraso, limitado ao piso da categoria, assegurados, em qualquer hipótese, o princípio do contraditório e da ampla defesa. A limitação será triplicada na hipótese de reincidência.
Cessada pela empresa a cobrança da gorjeta, desde que cobrada por mais de 12 meses, essa se incorporará ao salário do empregado, a qual terá como base a média dos últimos 12 meses, sem prejuízo do estabelecido em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
Para empresas com mais de 60 colaboradores, será constituída comissão de empregados, mediante previsão em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, para acompanhamento e fiscalização da regularidade da cobrança e distribuição da gorjeta, cujos representantes serão eleitos em assembleia geral convocada para esse fim pelo sindicato laboral e gozarão de garantia de emprego vinculada ao desempenho das funções para que foram eleitos, e, para as demais empresas, será constituída comissão intersindical para o referido fim.
Gratificação, prêmios por desempenho e ajuda de custo
A Reforma Trabalhista definiu que o valor fixo mensal estipulado em contrato, as gratificações legais e as comissões pagas pelo empregador são parte do salário do trabalhador. Isso significa que entram no cálculo de verbas trabalhistas e/ou previdenciárias tais como férias, 13º, FGTS, por exemplo.
Agora, a MP adicionou que gratificações de função, dadas para quem ocupa um cargo de grande responsabilidade na hierarquia da empresa, também são parte do salário.
Também limitou a ajuda de custo. Ela não é considerada salário desde que não exceda os 50% da remuneração mensal.
Jornada de trabalho 12×36
Texto em vigor: a legalidade do enquadramento no regime da escala de 12×36 está vinculada a sua estipulação mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
O que muda: a MP condiciona a prática da jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, a acordo coletivo e convenção coletiva, com exceção das empresas e entidades do setor de saúde.
Os trabalhadores da área de saúde são os únicos que poderão fazer acordo individual por escrito com o empregador estabelecendo esse tipo de jornada de trabalho.
Insalubridade
A MP revogou o inciso 13 do artigo 611-A da CLT, inserido pela Reforma Trabalhista, que permitia que a negociação coletiva prevalecesse sobre a lei no que diz respeito à prorrogação da jornada de trabalho em ambiente insalubre, sem licença prévia do Ministério do Trabalho.
O texto desse artigo agora exige que normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, previstas em lei ou em normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho, sejam respeitadas para que convenção coletiva ou acordo coletivo prevaleçam sobre a lei no tocante a enquadramento do grau de insalubridade e prorrogação de jornada em locais insalubres.
Gestante
Antes da MP 808, haveria o afastamento da gestante que trabalhasse em atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo apenas quando apresentasse atestado de saúde, emitido por médico de sua confiança, que recomendasse o afastamento durante a gestação.
O texto agora trabalha com a lógica contrária: proíbe o trabalho insalubre, a menos que a gestante espontaneamente apresente um atestado do seu médico de confiança liberando o seu serviço nessas condições.
As lactantes, no entanto, ficam sob a regra prevista inicialmente pela lei da reforma.
A MP retira ainda o adicional de insalubridade de quem for afastado.
Representação dos empregados
Texto em vigor: estabelecia que, nas empresas com mais de 200 empregados, poderia ser eleita uma comissão para representá-los em acordos com os empregadores.
O que muda: a MP estabelece que a comissão não substituirá a função do sindicato de defender os direitos e os interesses da categoria, determinando a participação dos sindicatos em negociações coletivas de trabalho.
Contribuição previdenciária
O segurado que recebe menos do que um salário mínimo por mês terá que pagar a diferença para complementar o recolhimento da contribuição previdenciária. Se não fizer isso perderá o status de segurado e pode comprometer seu direito ao benefício da previdência.