A Lei Federal nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, também denominada Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), representa o marco regulatório do direito à proteção de dados pessoais no Brasil, surgindo com uma dupla função: promover a inovação e o desenvolvimento econômico e tecnológico sustentável no país, e garantir os direitos fundamentais de liberdade, privacidade e livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Seguindo uma tendência global, a LGPD é, em apertada síntese, a primeira legislação nacional específica a regulamentar o tratamento dos dados de pessoas físicas no ambiente digital ou físico, com efeitos transversais, de modo a atingir todas as pessoas físicas, assim como as pessoas jurídicas de direito público e privado, que promoverem qualquer operação de tratamento de dados abrangida pela Lei com intuito econômico.
Assim sendo, desde o autônomo e o profissional liberal até empresas data driven e grandes corporações, todos estarão sob o alcance da LGPD e deverão respeitar as suas disposições, independente do seu tamanho, modelo de negócio ou nicho de mercado.
Por quê?
Porque, salvo raríssimas exceções dispostas no art. 4º da supracitada Lei, todas as pessoas anteriormente indicadas tratam dados pessoais, de uma forma ou de outra, seja coletando, armazenando, compartilhando, eliminando, acessando ou realizando qualquer outra operação de tratamento com dados pessoais de clientes ou empregados dentro dos critérios de territorialidade previstos em seu art. 3º.
E não importa se este tratamento de dados pessoais ocorre no ambiente digital, pelo site, e-mail, plataformas em nuvem, ou no ambiente físico, pelo recebimento de um currículo impresso e entregue na portaria da empresa, ficha cadastral, pastas em arquivos, ou qualquer outra forma: tudo deverá ser regulamentado conforme a LGPD.
Mas, afinal, o que são dados pessoais?
Pela natureza dos direitos que a Lei supracitada tutela, o legislador optou pela adoção de uma estratégia expansionista, pela qual considera como dado pessoal toda e qualquer informação que torne uma pessoa física identificada ou identificável (ex. nome, CPF, endereço, telefone, e-mail, dados do cartão de crédito, biometria, gênero, religião, etnia, informações de saúde, etc.).
Este dado pode ser público, publicamente acessível ou privado. Porém todos serão considerados como dado pessoal para os fins da LGPD e, por este motivo, devem ser protegidos.
A depender da categoria e da sensibilidade dos dados pessoais tratados, estes poderão ter uma proteção especial, com regulamentação específica de tratamento prevista na Lei em razão do potencial lesivo que eventual violação possa causar.
Por essas razões, pode-se afirmar que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais gerará um impacto imenso no cenário brasileiro.
Então, a LGPD é mais uma obrigação legal?
O Regulamento de Proteção de Dados Pessoais brasileiro não deixa de ser mais uma obrigação regulatória para todos aqueles que realizam atividades de tratamento de dados pessoais com fins econômicos de acordo com a legislação. Porém, não é apenas isso.
De fato, em seu artigo 52 a Lei preconiza a aplicação de diversas penalidades para os agentes de tratamento (empresas, profissionais liberais, indústrias, etc.) que infringirem às suas normas.
Com a previsão de fiscalização pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e aplicação de sanções administrativas a partir de 1º de agosto de 2021, que podem ir desde advertências, multas de até 2% (dois por cento) do faturamento da empresa em seu último exercício, limitada a R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) por infração, até a proibição total do exercício de atividades relacionadas ao tratamento de dados pessoais, a LGPD está sendo recebida por muitos como um entrave à economia ou mais uma obrigação legal, dentre tantas já existentes.
Além do poder fiscalizador e sancionatório da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, as pessoas físicas e jurídicas que tratam dados pessoais com fins econômicos correm o risco imediato de responder a demandas judiciais e extrajudiciais propostas por outros legitimados, tais como Ministério Público, órgãos de defesa do consumidor, titulares de dados pessoais (ex. seus clientes e colaboradores), dentre outros, visto que grande parte dos dispositivos legais já está vigente desde 18 de setembro de 2020.
Como se não bastasse, diversas empresas estão sentindo o empuxo da LGPD vindo de seus parceiros comerciais e fornecedores, que cada vez mais exigem a demonstração de conformidade daqueles com quem contratam, sob pena de desfazimento de negócios. Isso porque, de acordo com as disposições da Lei, podem ser conjuntamente responsabilizados por eventuais infrações legais praticadas por seus parceiros.
No entanto, se conseguirem olhar para além dos riscos regulatórios e da obrigação legal de conformidade, as organizações poderão encontrar na adequação à LGPD uma nova janela de oportunidades, através da qual poderão vislumbrar meios de aprimorar seus modelos de negócios, tornar mais úteis os dados que possuem, criar novos produtos e serviços, agregar valor reputacional, conquistando a confiança e fidelização de clientes e colaboradores, alcançar um diferencial competitivo – inclusive em escala global -, inovar e aumentar a eficiência dos processos internos, além da redução de custos.
A adequação à LGPD, embora demande um esforço de todos, poderá trazer incontáveis ganhos para as organizações, que ultrapassam os riscos eventualmente mitigados pela conformidade às suas disposições.
A conformidade pode – e deve – ser encarada através de um viés muito mais positivo dentro de um plano de gestão, uma vez que, se bem conduzida, não será apenas mais um custo, mas sim um investimento em prol do próprio negócio.
E isso começa a partir da compreensão da Lei e das melhores práticas para sua implementação, inclusive prioritariamente.
Ao partir do pressuposto de que toda e qualquer pessoa física ou jurídica que realiza atividade econômica baseada na oferta de produtos ou de serviços, utiliza-se de dados, poderá se compreender que estar em conformidade com a LGPD, mais do que uma obrigação legal, é essencial para a sobrevivência do próprio negócio.
Portanto, aqueles que buscarem se adequar às disposições da nova lei, além de reduzirem os riscos de penalidades judiciais e extrajudiciais, encontrarão inúmeros benefícios e pavimentarão o caminho para o futuro de suas atividades econômicas e da sociedade como um todo.
Por Ana Claudia Bonassi Machado